Os desafios da monetização no meio digital

E o mercado, como anda? 

A receita do jornalista, rendimentos obtidos através da venda do seu trabalho, seja freelancer, autônomo ou em vínculo empregatício com empresas, sofreu com a transformação para o digital.

Pablo diz que a construção desse novo cenário é incerta, e a monetização também, já que os vínculos empregatícios oscilaram e se reformularam. “Então, hoje, essa palavra monetização, ela não existia antigamente. A gente era pago pelo nosso trabalho. E o jornalismo foi mais um desses trabalhos que entrou na bacia de coisas que não valem o pagamento.”, comenta Miyazawa.

Segundo a pesquisa “Evolução do Emprego nas funções do Jornalismo”, da Federação Nacional dos Jornalistas (FENAJ), em 2006, o Brasil registrava cerca de 42 mil vínculos formais em funções ligadas ao jornalismo. Esse número cresceu de forma constante, alcançando o patamar máximo em 2013, com mais de 60 mil vínculos ativos. A partir de então, a curva se inverteu: entre 2013 e 2023, os empregos formais caíram 18%, com perdas mais intensas nos anos de 2016 e 2020.

As publicidades, sobrevindas através de anunciantes, também podem ser determinantes se um conteúdo vai ou não ser publicado em um veículo. “Várias e várias vezes eu tive matérias que caíram ou entraram de última hora, porque a gente tinha uma quantidade de cadernos para imprimir, e tem esse balanço entre publicidade e editorial.”, elucida Franklin.

Muitos jornalistas agora precisam ser também influenciadores para se manter financeiramente estáveis. As famosas publis (termo usado na internet para se referir a publicidades) no cenário atual são fechadas com os criadores de conteúdo digital, e não mais tanto com os veículos tradicionais. 

Mariana Viana e Pedro Ferreira, jornalistas mineiros e apaixonados por quadrinhos, criaram em 2017 o projeto Fora do Plástico, com conteúdos jornalísticos sobre o nicho. Eles ressaltam algumas parcerias que são benéficas: “Se hoje a gente faz tantas publis com tantas editoras diferentes, foi essa questão de confiança com as editoras. Vou dar um exemplo de um quadrinho, que é uma série infantil. A gente fez publi sobre os volumes 1, 2 e 3. A gente não fala para crianças, a gente conversa com um público amplo. Mas a editora, em todos os volumes, eles nos procuraram para fazer a publi.”

Antigamente a lógica da publicidade eram os comerciais exibidos durante as grades de programação das emissoras, ou entre as matérias das revistas. No digital, isso funciona de um jeito mais prático, onde o próprio criador de conteúdo além de fazer a propaganda e a divulgação, também é o meio emissor da publicidade, como os storys postados em suas redes, falando de algum produto que aquele criador tem contrato publicitário, e até mesmo os posts no feed do instagram, onde essas marcas recebem grande visualização usando não só da imagem, mas o perfil do criador; sendo assim, o rosto e o canal de divulgação ao mesmo tempo.

Já para Dora Guerra, repórter do G1, as publicidades são algo que não condizem com as diretrizes do jornalismo. “E aí eu vou ganhar dinheiro para falar bem de um álbum? Vai contra o meu jornalismo. É uma área que é muito mal remunerada, uma área complicada. Você tem que sobreviver, mas acho que tem que ter um limite”, salienta Guerra. 

Rodapé entrevista Laís Franklin: o que permanece essencial na produção do jornalismo cultural?

E o dinheiro, de onde vem?

Este cenário de incertezas na renda também é realidade no dia a dia dos criadores de conteúdo digital. Ter diversas fontes de renda tornou-se uma estratégia de sobrevivência. Muitos profissionais combinam trabalhos fixos com produções independentes, parcerias e publicidades para variar sua renda. O jornalista e criador de conteúdo precisa atuar como criador, gestor e estrategista, adequando múltiplos papéis para garantir uma estabilidade.

Valentina Pulgarin, apresentadora da Warner Bros Discovery Brasil e criadora de conteúdo digital, aponta que sua renda não vem apenas de uma única fonte. “Hoje em dia, as publicidades e o que eu ganho da Warner são meio que 50% a 50%. E aí tem um restinho que vem das plataformas que eu não gosto tanto de contar com isso para que eu pague as minhas contas”.

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Pedro e Mariana (Fora do Plástico) realizando entrevista em evento de quadrinhos - Foto: Arquivo pessoal

Com o avanço do digital, foram surgindo iniciativas que pudessem ajudar criadores de conteúdo a desenvolverem seus projetos, como, por exemplo, financiamentos coletivos – que é a captação de recursos financeiros para um projeto, ideia ou causa por meio da contribuição de várias pessoas, geralmente realizadas por plataformas digitais que ajudam o projeto a se manter.

Mariana e Pedro enfatizam como essas iniciativas são importantes para o projeto continuar existindo. “O financiamento coletivo foi a grande virada pra gente. Foi quando a gente conseguiu ter a segurança financeira para que a gente conseguisse fazer o Fora do Plástico ser o nosso trabalho. Foi o primeiro passo de segurança financeira.”, traz Mariana.

Com o crescimento do projeto, Pedro observa que novas oportunidades foram surgindo. “Com a profissionalização do nosso trabalho, foram aparecendo oportunidades de publicidade.”

A nova economia das plataformas

Além da publicidade e o financiamento coletivo, existe o retorno que as próprias plataformas fornecem. O Substack, focado na criação de newsletters, deixa o próprio criador precificar o seu produto; ou seja, ele escolhe quanto quer cobrar por assinaturas e assim recebe proporcional a esse valor.

“Você também tem uma questão de como fazer para monetizar esse conteúdo. Porque, por exemplo, no YouTube, uma época era muito mais fácil, era meio que de acordo com o número de visualizações do perfil. Hoje, o TikTok também tem uma outra métrica para essa monetização”, diz Daniela.

No youtube, a métrica RPM( Receita por Mil) é importante para a renda dos criadores de conteúdo. Nesta métrica, mostra quanto dinheiro um criador ganha a cada 1.000 visualizações de vídeo. Essa renda pode variar conforme o número de visualizações.

Outras métricas importantes incluem Apoio ao Canal (ferramenta de monetização que permite aos usuários tornarem-se membros do canal, pagando uma taxa mensal para ter acesso a benefícios exclusivos, como emblemas, emojis e conteúdos extras). Essas formas de receitas são importantes para esses criadores obterem uma renda recorrente e de fortalecerem a sua comunidade, enquanto os apoiadores recebem vantagens especiais por seu apoio financeiro.

Além do Youtube e financiamento coletivo, existem outros canais que também dispõe de recursos e que auxiliam os criadores, Mariana e Pedro falam um pouco em como o Telegram ajudou eles a consolidar seu público.

“A gente criou o grupo de apoiadores, no Telegram, que é onde funciona a nossa comunidade. A partir de um valor você tem direito a participar de um grupo secreto no Telegram. Na época eram 20 reais. Isso meio que atraiu as pessoas a quererem participar e aí também a gente criou o clube de leitura.”

O Telegram é uma plataforma que tem como foco mensagens instantâneas. Criado em 2013, a ferramenta tem a funcionalidade de criar grupos e canais. Cada grupo pode ter até 200.000 usuários, enquanto os canais, focados em públicos maiores, tem um número ilimitado de usuários.

Seguindo essa linha, Mariana comenta sobre a utilização do site do Fora do Plástico para divulgação de publicidades. “Porque aí com a profissionalização do nosso trabalho foram aparecendo oportunidades de publicidade. O próprio site hoje em dia tem crescido bastante a gente hoje tem espaços de publicidade para começar a monetizar o próprio site. É só com gente de quadrinhos, com as editoras, com os próprios autores, que é um jeito de a gente manter o interesse do nosso público.”

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Pesquisa no site Fora do Plástico - Foto: Rodapé

Existem todos esses critérios para monetizar em plataformas como o YouTube, porém jornalistas como Pablo Miyazawa ponderam. “A gente vai produzir um baita texto legal na newsletter, fazer um vídeo incrível, um documentário para colocar no YouTube, no Instagram, e a gente fica à mercê da monetização, dos centavos.”

O Censo de Criadores de Conteúdo do Brasil 2025, realizado pela Wake Creators, ouviu 4.500 influenciadores e revelou que apenas 9% têm a profissão de criador de conteúdo como única fonte de renda.

Ou seja, mesmo com todos os recursos para obter renda (métricas, canais de apoio, financiamentos e publicidades), ainda há muitos jornalistas e criadores que não conseguem formar uma base de renda apenas com o valor recebido das plataformas e de outros recursos.

Esse modelo autônomo de criar abre margem para a falta de delimitação de trabalho, quando os jornalistas passam a criar conteúdos contínuos. Agora, os jornalistas são gestores do seu tempo, fazem suas regras e seu trabalho é mais amplo.
Em muitos casos, com poucas limitações típicas dos modelos mais tradicionais, como jornadas longas e supervisores a quem responder.

Elane Gomes, professora adjunta de jornalismo na Universidade Federal de Pernambuco, ressalta que, no aspecto tradicional, havia um modelo de trabalho muito linear. “A gente ia lá, cumpria presencialmente a um determinado ambiente, cumpria as cinco horas, terminava, ia para casa. E aí, no outro dia, novamente, nesse modelo CLT. Com o digital, a gente acaba tendo esse fluxo de trabalho mais alargado.”

Mesmo com todas incertezas de se manter financeiramente estável e de ter seu espaço nesse novo ambiente digital, quem prevalece relevante em meio a quantidade tremenda de informação?

Rodapé entrevista Valentina Pulgarín: é possível ganhar dinheiro com a produção de conteúdo na internet?